Como me lembro bem,
Dos meus Natais de outrora!
Na noite de consoada,
Depois da Missa do Galo,
Colocava o sapatinho,
Encostado à chaminé,
Do lado do canapé,
Para o Menino Jesus,
(não havia Pai Natal)
Deixar a minha prendinha.
No outro dia, acordava
Bem cedo, de manhãzinha.
Nada de frio ou sono.
Corria direita à sala
E, encostado à chaminé,
Do lado do canapé,
Lá estava o embrulhinho.
Até pelos nove anos,
A surpresa na lareira
Destinava-se à brincadeira.
Umas lindas bonequinhas,
Um fogão e panelinhas,
Mobília para a casa das bonecas
Ou para o chá ,umas canecas.
Depois, já mais velhinha
E na posse dos segredos,
Acabaram os brinquedos.
Mas sempre pelo Natal,
O sapato lá ficava,
Encostado à chaminé,
Do lado do canapé.
Era a mesma curiosidade
E também a ansiedade.
Ou camisola ou casacos,
Até um par de sapatos.
Em outros anos uns livros,
Uma pasta, um enfeite…
Mas tudo era um deleite!
Um pouco mais velha ainda,
Mas ainda não formada,
Com uns tostões da mesada
Passei a entrar na jogada.
Depois de todos deitados,
Ia eu, pé ante pé,
Pôr junto à chaminé,
Do lado do canapé,
Os sapatos de meus pais.
(com irmãos fui filha única)
E logo lá colocava
Os miminhos que lhes dava,
E que com muito cuidado
Levava, escondidos na mala,
Quando ia para férias.
Na manhã de Natal
A cena já não era a mesma.
Também acordava cedinho
E entrava na sala de mansinho.
Mas sentava-me no canapé,
Ao lado da chaminé,
Para esperar os pais chegar
E, juntos, os presentes desembrulhar.
Se um dia pensei pedir desculpa
Por aquelas ninharias,
Esqueci as cortesias.
O sentimento de alegria
Que os seus rostos transmitia,
Tirava-me toda a culpa.
O tempo passou
E tudo mudou.
Não corro atrás do passado.
Foi um caminho andado.
Não passo o Natal em Donelo,
Não ponho o sapato na chaminé,
Nem me sento no canapé.
Recordo com nostalgia.
Mas compensa-me a alegria
De, na noite de Natal,
Ter os filhos ao redor,
Ver as netas rir e saltar
E correr para me abraçar.
Maria Luísa Taveira